Alguns dias depois que o computador chegou, um vendedor que trabalhava com o meu pai ficou sabendo do ocorrido e resolveu nos passar umas revistas que ele tinha em casa. As revistas eram de 1984 — fascículos que formavam o Micro Computador – Curso Básico. De 1984 até 1997 são 13 anos, de forma que o conteúdo não era mais muito atual. Já vivíamos outra fase dos computadores, que já estavam inclusive deixando de serem chamados de “micros”.

Talvez o vendedor queria se livrar de tralha velha sem o peso na consciência de ter jogado fora. Meu pai, por via das dúvidas, entregou para mim.

É claro que é difícil afirmar quais acontecimentos tiveram qual peso na hora de moldar o futuro de alguém. Mas, se alguma coisa teve impacto no meu futuro, então foi a coincidência de comprarmos por acaso um computador e ganharmos por sorte essas revistas.

Quando comecei a ler, imediatamente achei tudo muito interessante. Bem, nem tudo, tinha muita coisa de hardware lá, que não me interessavam porque acho que nunca gostei muito do mundo físico e também porque aquilo não tinha correspondência nenhuma com o equipamento que eu tinha. Mas as revistas falavam de programação, de software, de planilhas eletrônicas, de jogos, de código de máquina — assuntos altamente empolgantes.

Mas a parte de software das revistas também estavam desatualizadas. Nada do que eles falavam eu conseguia encontrar. Já no primeiro número, eles mostravam este programa:

10 REM OS COMPUTADORES JAMAIS COMETEM ERROS
20 PRINT "DIGITE UM NUMERO"
30 INPUT A
40 LET A = A + 1
50 PRINT "ACHO QUE O NUMERO QUE VOCE DIGITOU FOI";
60 PRINT A
70 END

E eu conseguia entender a explicação sobre como o programa funcionava, mas eu não sabia onde digitar para que ele rodasse. A revista dizia, “Ligue o micro e digite o programa exatamente como é apresentado, incluindo os espaços”, mas claramente isso não funcionava no Windows 95. “Após ter digitado o programa, datilografe LIST <CR>. O programa que você acaba de digitar deve reaparecer na tela.” “Quando você considerar o programa digitado corretamente, você pode processá-lo, digitando RUN <CR>.”

Um dia — já era tarde — eu estava no computador e resolvi digitar o programa no QBASIC, que eu só conseguia acessar porque estava no menu Iniciar. Sim, parece bastante óbvio que um programa chamado QBASIC sirva para rodar programas escritos em Basic, mas por algum motivo levou alguns dias para cair a ficha. E, quando eu digitei o programa no QBASIC, ainda assim eu não sabia o que fazer, porque não tinha nada de “RUN” lá. Fui fuçando, de repente fui no menu Executar (era em português mesmo)… depois Iniciar… e voilà! Rodando!

Mas já era tarde e meus pais me obrigaram a ir para a cama. Eu tentei explicar que eu estava vivendo um momento de heureca, mas eles não estavam muito aí.